Banca de jornal: contato direto com as ruas…

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Por Geraldo Antunes

– Bom dia – disse um transeunte ao jornaleiro, numa manhã quente de dezembro, ainda escura, em plena av. Ipiranga, na Banca em frente ao edifício  Copan – sabe me dizer onde fica a rua Panetone?

Meio atordoado pelo sono e pelo inusitado da pergunta, o jornaleiro pensou tratar-se, por um momento, de uma brincadeira, de uma pegadinha, muito na moda nos anos 1990.

Respondeu com uma outra pergunta, reforçada pela cara torta de espanto: rua Panetone???

A resposta desconcertou um pouco o pobre pedestre que, depois de um leve pigarrear de embaraço, repetiu  o nome da rua, porém, com uma pequena diferença fonética. Meteu um sonoro “S” no meio do panetone e soltou:

– Rua PaneStone!!

Foi a senha para disparar o aplicativo mental, automático, que todo jornaleiro desenvolve ao longo do tempo, de tanto responder e indicar a localização de ruas.

Com o dedo em riste, apontou ao assutado cliente e disse de chofre, quase radiante: rua Nestor Pestana!!

Isso!! –  retrucou o arguidor desavisado – rua Nestor Pestana!!

– Sobe reto, primeira à direita etc. etc.

Essa introdução, que de fictícia não tem nada – o jornaleiro era esse que vos escreve – serve para comprovar o quanto estamos perdendo com o lento, mas severo, definhar de uma verdadeira instituição da cena urbana: a banca de jornal.

Postos avançados da difusão de notícias, fofocas e de tantas outras informações, mais ou menos sérias, as bancas de jornais atingiram, no seu ápice, o verdadeiro status de ambiente “cult”.

Ponto de encontro das pessoas com seus ídolos da TV e do cinema, dos fãs com seu jogador de futebol predileto ou com seu time de coração, as bancas, foram, aos poucos, transformando-se, passando a atrair um público mais intelectualizado, através de publicações cada vez mais sérias, aprofundadas e caprichadas.

Houve tempo em que, entre publicações nacionais e importadas, era possível se conhecer uma boa parte do mundo e das suas diversas culturas apenas frequentando uma boa banca de jornal.

Algumas se tornaram verdadeiras lojas, oferecendo, além de lazer e informação, muito do que um cidadão precisa numa hora de necessidade.

De fichas telefônicas (sim, elas existiram!) a guarda-chuvas, de cigarros a lanternas, de cartões de estacionamento (??) a baralhos, de doces a filmes fotográficos (what?).

E, no meu entender, o mais importante e insubstituível: ofereciam espaço e oportunidade para um bom papo, para a troca e compartilhamento de experiências entre pessoas mais ou menos conhecidas, num ritmo de intimidade entrecortada e relativa, nunca explícita, mas sempre buscada.

Quantas e quantas horas dedicadas a consertar os problemas do mundo ou do time que capenga no campeonato?

Quantas confissões feitas e segredos insondáveis desvelados, quantas sentenças indiscutíveis sobre o novo cabelo da protagonista da novela ou em relação ao governo de plantão, num movimento de moto perpétuo, que se renovava a cada manhã?

Esse tempo, me parece, está terminando, e de forma célere. O número de pequenas bancas que fecham suas portas todos os dias chama a atenção. Pelo menos pra mim, que já vivi disso.

Restam as grandes, mais bem localizadas, fartas de produtos e organizadas.

Até quando resistirão, não me atrevo a dizer.

Que seja por muito tempo, para que possam ouvir muitos e muitos pedidos pitorescos de informações sobre ruas ou de procura por produtos inesquecíveis…

– O senhor tem pilha de eucalipto?

– Qual prefere, duracell ou energizer?

 

 

 

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sobre o autor

Geraldo AntunesCorretor Associado

Sabe aquele cara que sabe fazer um pouco de tudo e tem o dom para atendimento? Esse cara é o Geraldo. Sua formação e atuação são multifacetadas. Por vários anos, gerenciou a banca de jornal...

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