Carta – Domus
Quando aportei por aqui, nem podia imaginar que Higienópolis fora o quintal dos barões cafeeiros.
Eu me interessava mesmo era pelo belo, e continuo me interessando.
A estética, seja arquitetônica, moda, artística, é uma linguagem muito contundente. E o bairro? Enchia meus olhos nesse quesito.
Minha primeira morada era simples e generosa. Pé-direito altíssimo, cômodos amplos, muita luz natural e uma excelente localização.
Depois disso, impossível se apaixonar por menos. Foi aí que conheci esse velho de 60 anos, o Domus, charmoso e apoteótico com suas linhas modernistas bem marcadas.
E com tantos apelidos que tem – dentadura, navio, bolo de noiva, mandíbula, proa – era, no mínimo, diferente.
Logo após essa trombada, sonhava e mentalizava todos os dias sempre que passava na frente do prédio, e não perdia uma única chance de dizer, “um dia vou morar aqui”.
Até que o sonho começou a se materializar; de uma forma torta, mas se realizou.
Quando pude mudar para o apê dos sonhos, o Domus não tinha nada disponível.
Resolvi investir em outro novo sonho na Rua Piauí. Acertada a primeira fase da transação de compra e venda, fui comprar um vinho no Empório ali perto para celebrar. Com minha boca grande, saí espalhando o grande feito do novo apê, quando a gerente entrou e perguntou:
– Por que você não trabalha com minha irmã, que é corretora?
Respondi prontamente:
– Imagina, já está tudo resolvido.
De repente, a tal irmã aparece magicamente diante de mim, na porta.
– Deixa eu te mostrar um imóvel? Só um, disse ela. É a sua cara.
Sem fazer nada, e amando design como amo, aceitei.
Partimos rumo à Rua Sabará para literalmente me desestruturar e enlouquecer.
Depois, fiquei inventando mil manobras para dar o fora no imóvel da Rua Piauí, sem prejuízo. Inesperadamente, recebi o telefonema da corretora desesperada: a proprietária tinha desistido do negócio, e eu feliz da vida sugeri que, para ela não sair no prejuízo, eu iria deixar zero a zero, nem devíamos e nem pagávamos nada uma a outra.
Mal demos as mãos para selar o desacordo, saí correndo para o Domus.
MORAL DA HISTÓRIA: O QUE É DO HOMEM O BICHO NÃO COME. OU SE PREFERIR: QUEM ESPERA SEMPRE ALCANÇA.
Essa é minha história pessoal com o lugar mais importante da minha vida: minha casa.