Descrição
Duas casas com características distintas, 350m2 em um terreno de 1000m2, 4 dormitórios, salas, ateliê, e uma área externa absolutamente única. No coração do Campo Belo.
Construídas nos anos 40, no Campo Belo, elas refletem vários aspectos do pensamento do arquiteto, apesar do pequeno intervalo de tempo que as separa, são casas com características completamente distintas.
Começando pela “Casinha” do Artigas:
Singela em sua plástica e complexa em seu projeto, inspirada na obra de Frank Lloyd Wright. Implantada a 45º em relação aos limites do terreno, ela foi construída ao redor de um núcleo central, apresenta circulação cíclica e espaços integrados.
A sala de estar e jantar, cozinha e o banheiro se localizam no nível da entrada, meio nível abaixo, está o ateliê e meio nível acima, o quarto.
Segunda residência do Arquiteto:
Construída no mesmo terreno, pode-se dizer que ela se divide em dois blocos,
definidos pelas “asas” do telhado. Em um deles encontram-se a sala, o terraço e o ateliê, no outro bloco estão os 3 quartos, a cozinha e dois banheiros. Também foi construído um anexo para a garagem, coberto por uma abóboda, a ligação entre ele e a casa configura o patio de serviço.
Suas características espaciais, ou seja, seus espaços abertos e integrados, assim como sua localização, no bairro Campo Belo, viabilizam o uso comercial.
Outra característica de destaque é o fato de apesar de estarem no mesmo lote, elas são totalmente isoladas.
O conjunto soma 350 metros quadrados de área construída, em um lote de 1000 metros quadrados.
Criar os textos para descrever as casas é sempre um desafio: começando pelo título, pois colocar o nome do arquiteto ou de quem encomendou o projeto, acompanhado do ano de construção, não nos agrada, buscamos títulos que se relacionem com as histórias delas. Outro desafio é selecionar quais aspectos revelar, principalmente das casas já famosas, das quais temos a impressão de conhecer todos os detalhes.
Hoje nosso desafio é duplamente maior, pois vamos falar das duas casas projetadas, construídas e habitadas pelo Artigas. Vamos começar falando da segunda residência do arquiteto projetada em 1949, essa subversão da ordem cronológica é devido ao fato de ela ter sido construída com o objetivo de abrigar a família, diferente da “casinha”, que era utilizada para veraneio e como ateliê.
Ao cruzar o pequeno portão de ferro, passamos por um caminho pavimentado com tijolos e chegamos a porta de entrada, protegida por uma laje plana instalada logo acima dela, com a intenção de recepcionar o visitante. Quando a porta se abre, temos uma sensação completamente nova, o pé direito alto acompanhando a inclinação da cobertura, aliado as vedações de vidro, criam um ambiente sensorialmente maior, o primeiro elemento que se avista é a lareira, com nichos destinados a guardar livros e obras de arte, pode-se dizer que ela é o elemento central da construção, dividida em dois blocos, marcados pelas “asas” do telhado.
O bloco da direita é composto pelo living, a varanda e o estúdio, este localizado um nível acima, constituem o setor destinado ao convívio social, aberto aos convidados. Já o bloco da esquerda, escondido quando a porta da entrada está aberta, é destinado ao uso restrito da família, é onde estão a cozinha, os dormitórios, banheiros e o pátio de serviço.
Como o projeto não previa muros, Artigas lança mão de duas soluções para garantir a privacidade do interior da casa, a primeira delas na parte social, as paredes laterais do living são apenas vedações, não tem função estrutural e são totalmente independentes da cobertura. A segunda solução está na implantação da garagem, diagonal em relação ao corpo da casa, ela protege da visão da rua, o corredor de circulação dos quartos e da cozinha, criando um espaço destinado aos serviços. Além da função pragmática da implantação do volume da garagem, também existem funções poéticas: como garantir a harmonia do conjunto formado pelas duas casas e evidenciar o telhado borboleta, criando um ângulo triédrico com o bloco mais alto, uma hipérbole do ponto de vista plástico, que constrói um belíssimo ponto de vista a partir da entrada.
Alguns detalhes se destacam, como as paredes de tijolos e piso de “vermelhão”, que além de manter a unidade estética do projeto, foram escolhidos visando a facilidade de execução da obra, também há de se destacar as luminárias, “incrustadas” nas lajes.
Além de ter sido a residência de um dos maiores arquitetos brasileiros, a relevância dela está na sutileza das decisões projetuais, onde a plástica e a função são intrinsecamente ligadas, nela é possível perceber a recorrência de algumas características presentes na “casinha”, como as diferenças de altura do pé direito externo e interno, e os banheiros ocupando a posição central, que além da função de suportar o telhado, também garantem iluminação natural.
Em 1942, foi construída a primeira residência em um lote de esquina no bairro do Campo Belo, conhecida popularmente como “casinha”, ela era o refúgio de campo do casal Artigas, que na época morava no Edifício Guarani, projeto do Rino Levi. Dá para imaginar como o Campo Belo deveria ser um lugar bucólico nos início dos anos 40, fazendo justiça ao nome do bairro, onde Virginia e João Batista escolheram passar muitos finais de semana produzindo sua arte.
A implantação da obra a 45º, em relação aos limites do lote, segundo alguns críticos de Arquitetura teve a intenção de anular a hierarquia de uma fachada, mas parece que a verdadeira motivação era ter uma vista privilegiada de todos os ambientes da casa, a grande janela da sala de estar, uma espécie de “bay window”, confirma essa hipótese.
É possível perceber a influência da obra de Wright desde o exterior, a pérgola e a utilização de tijolos aparentes, são elementos estéticos que se destacam, no interior percebemos que não há laje e sim um forro de madeira acompanhando a inclinação do telhado.
O fato de o projeto ter sido desenvolvido pautado nas reais necessidades do jovem casal permite que a casa rompa diversos “protocolos” da época, além dos espaços integrados, ela também apresenta espaços abertos, como o dormitório instalado no mezanino acima do ateliê. A preocupação com as soluções técnicas também foram uma constante no desenvolvimento do projeto, desde a construção das paredes laterais, que não ultrapassam a altura de uma porta, até a concentração das instalações hidráulicas.
O impacto e a relevância dessas casas está na sua simplicidade, mostrando-se eficaz ao que se propõe, sem perder a poesia e, por isso, devem ser preservadas. O título do texto é uma frase dita pela Wilma, nora do Artigas, enquanto nos apresentava a casa, essa frase sintetiza toda a sua importância: mesmo sendo um ícone da Arquitetura residencial paulistana, ela não deixa de ser uma casa de verdade, uma lar, onde a família ainda mora e luta para preservá-la.
Atualmente a casa atende um restaurante, café e o instituto Casa Vilanova Artigas.
Patrimonio histórico tombado.